SEMANA 1:
·
O contexto ético anterior a Aristóteles e os conceitos-chave da ética
aristotélica
Existe uma profunda ligação entre ética e
filosofia: a ética nunca pode deixar de ter como fundamento uma concepção
filosófica do homem que nos dá uma visão total deste como um ser social e
histórico. Dentre os vários conceitos com os quais a ética trabalha e que
pressupõe um prévio esclarecimento filosófico, como os de liberdade,
necessidade, valor, consciência, vamos dar ênfase ao de sociabilidade, ou seja,
como a ética deve estar inserida nas relações humanas em sociedade.
A ação humana é fruto de uma escolha entre o certo e o
errado, e entre o que é bom e o que é mal. O indivíduo procura se basear em
parâmetros socialmente aceitos que lhe permite conviver com as outras pessoas,
em outras palavras, ele busca sempre se guiar pelos conceitos que norteiam a
prática dos valores positivos e das qualidades humanas. A ética não somente
serve de base para as relações humanas, mas, trata também das relações sociais
dos homens na medida em que os filósofos consideram a ética como base da
justiça ou do direito, e até mesmo das leis que regulam a convivência entre
todos que vivem na sociedade.
Primeiramente pra entendermos sobre a ética devemos pelo conceito filosófico entender
que é a área que investiga o comportamento humano em suas relações entre si,
considerando conceitos utilizados para avaliá-las como: valor, virtude,
justiça, moral, bem, normas morais, dever, liberdade e principalmente
responsabilidade; promove também reflexões sobre a busca humana pelas melhores
formas de agir, viver e conviver. De forma mais específica, segundo Gilberto
Cotrim,
A ética é uma disciplina teórica
sobre uma prática humana, que é o comportamento moral... A ética tem também
preocupações práticas. Ela orienta-se pelo desejo de unir o saber ao fazer.
Como filosofia prática, isto é, disciplina teórica com preocupações práticas, a
ética busca aplicar o conhecimento sobre o ser para construir aquilo que deve
ser (COTRIM, 2004, p.264).
Como teoria filosófica, a ética se caracteriza como estudo
das ações individuais dos homens, cuja finalidade consiste em elaborar uma
orientação normativa para as ações humanas que seja estabelecido como bem. Com
o filósofo grego Aristóteles a ética passou a ser a “ciência do moral”, ou seja
do caráter e das disposições do espírito. Enfatizamos que a ética é um conjunto
de argumentos que são utilizados pelos indivíduos para justificar suas ações,
solucionando com diferentes problemas em que há o conflito de interesses com
bases em argumentos universais. Ou salientamos que a ética é uma filosofia
responsável por estudar a moral, contestando e identificando o que podemos
chamar de regras morais vigentes, as quais são alteradas com o tempo. A Ética
como teoria filosófica tem por objetivo estudar o comportamento dos indivíduos
frente aos apelos morais da sociedade em que este vive. Ela se manifesta de
diferentes maneiras conforme a cultura, costumes e hábitos de determinadas
populações.
As reflexões da ética abrangem
aspectos da vida pública e das leis estabelecidas no plano social para a
existência humana. Envolvem questões ligadas ao direito, ao poder, a cidadania
e a política, e abrange também aspectos da vida privada, analisando algumas
questões morais de foro íntimo ligadas as condutas e escolhas de indivíduos em
nosso cotidiano, e são elas que determinam o modo como cada um convive consigo
próprio e com os outros.
As respostas filosóficas para as questões éticas variam no
tempo e no espaço, e ainda apresentam uma característica fundamental que
envolve a posição dos indivíduos em relação ao valor e as virtudes que são
defendidos em seu meio cultural. Com isso, os filósofos investigam o que leva
diferentes grupos sociais a se enfatizarem sobre questões e valores
semelhantes, sem ignorar que, os significados atribuídos a eles nem sempre são
os mesmos. Há filósofos que concebem o homem como um ser dotado de um senso
moral inato, ou seja, da capacidade natural para avaliar como as coisas e como
elas deveriam ser. Alguns acreditam que as diversas tendências culturais e
individuais atuam sempre sobre a capacidade comum entre os seres humanos e são
determinantes da formação do caráter e da personalidade. E há filósofos que
afirmam a existência da liberdade, ressaltando sempre que, apesar da pressão de
costumes e leis, nós sempre podemos refletir sobre as questões éticas e sobre a
moral aprendida, e que, segundo eles, há uma possibilidade que nos faz
responsáveis por nossas próprias escolhas e que nos permite contribuir para a
renovação com as normas com que nos deparamos no dia a dia.
Nos
tempos áureos da filosofia grega a justiça e todas as demais virtudes éticas
eram políticas e sociais, o que denota uma certa inseparabilidade entre a ética
e política, ou seja, está relacionado entre a conduta do indivíduo e os valores
da sociedade.
No pensamento dos Antigos filósofos a
existência humana só pode ser pensada em sociedade onde os seres humanos
aspiram ao bem e a felicidade, que só pode ser alcançada pela conduta virtuosa.
Além disso, existe uma preocupação constante com a busca dos valores morais
inscritos no interior do próprio homem, como acreditava Sócrates. Dessa forma –
para ser ético – o homem deveria entrar em contato com a sua própria essência,
a fim de alcançar a perfeição. O homem, como qualquer ser, busca a sua
perfeição, que acontecerá quando sua essência estiver plenamente
realizada. E como afirma Mondin, “A ética ou moral... é o estudo da
atividade humana com relação a seu fim último que é a realização plena da
humanidade” (1980, p.91)
Sócrates, que se tornou símbolo da própria filosofia,
dedicou atenção especial as questões éticas, sendo que ele julgava o ser humano
que era dotado de uma natureza racional e voltada para o bem. Ele tentava
sempre compreender a essência das virtudes e do bem, tal como a justiça, a
prudência, a coragem, e entre outras. Sócrates de alguma forma procurava saber
dos cidadãos atenienses sobre a virtude, a essência, saber se uma conduta é boa
ou não, e porque o bem é uma virtude e o mal um erro, e com tudo isso as
perguntas ética-socráticas não estão destinadas somente ao indivíduo, mas
também a sociedade.
Pode-se resumir a ética dos antigos em pelo menos dois
aspectos: o agir em conformidade com a razão e a união permanente entre ética
(a conduta do indivíduo) e política (valores da sociedade). A ética é uma
maneira de educar o sujeito moral (seu caráter) no intuito de propiciar a
harmonia entre o mesmo e os valores coletivos.
Na Idade Média a Filosofia sofrerá uma forte influência da
tradição cristã. Uma vez, que todos os Filósofos deste período são teólogos,
bispos, abades e padres. Dessa forma a filosofia permanecerá, ao longo de todo
período medieval, subordinada a teologia, de tal modo, que é impossível separar
o pensamento filosófico da tradição grega, do pensamento teológico cristão.
Neste caso a vida ética era definida por sua relação espiritual e interior com
Deus e pela caridade com o seu próximo, por meio da revelação divina. A ética
cristã se fundamenta no amor, no qual foi colocado como primeiro e maior mandamento:
o amor a Deus acima de todas as coisas e o amor ao próximo. É no amor que o
cristianismo encontra sua realização espiritual mais profunda e as bases
fundamentais para a vida em sociedade.
Os primeiros filósofos cristãos procuravam conciliar fé e
razão como instrumento de análise e reflexão. A partir desse pressuposto a
filosofia insurge no campo da ética cristã, como tentativa de justificar seus
princípios e normas de comportamento, se submetendo a lei divina revelada pelas
Sagradas Escrituras implicando uma determinação racional do próprio conteúdo
sobrenatural da Revelação, mediante uma disciplina específica, a teologia
dogmática.
Assim como Sócrates e Platão, o bispo, teólogo e filósofo do
início da Idade Média, Santo Agostinho, foi um homem profundamente voltado para
a sua interioridade, uma vez que é nessa interioridade, que podemos realizar
nosso encontro com Deus e nossa verdadeira essência. É dentro desta perspectiva
de uma filosofia introspectiva que Agostinho agrega uma série de conceitos
fundamentais. Os filósofos medievais herdaram elementos da tradição filosófica
grega, reconfigurando-se no interior de uma ética cristã e tal como Santo
Agostinho, a filosofia de São Tomás de Aquino representa uma aproximação entre
fé e razão mas, neste caso, usando o pensamento aristotélico como base
fundamental. Inspirado na filosofia aristotélica e amparado na visão cristã de
mundo, Aquino reflete sobre a conduta ética que é aquela na qual o agente sabe
o que está e o que não está em seu poder realizar, referindo-se, ao que é
possível e desejável para um ser humano. A ética tomista também deve ser
trabalhada no âmbito da sociedade. Analisando a natureza humana, resulta que o
homem é um animal social (político) e, portanto, forçado a viver em sociedade
com os outros homens. A primeira forma da sociedade humana é a família, de que
depende a conservação do gênero humano; a segunda forma é o Estado, de que
depende o bem comum dos indivíduos. Sendo que apenas o indivíduo tem realidade
substancial e transcendente, se compreende como o indivíduo não é um meio para
o Estado, mas o Estado um meio para o indivíduo. Segundo Tomás de Aquino, o
Estado não tem apenas função negativa (repressiva) e material (econômica), mas
também positiva (organizadora) e espiritual (moral). Embora o Estado seja
completo em seu gênero, fica, porém, subordinado, em tudo quanto diz respeito à
religião e à moral, à Igreja, que tem como escopo o bem eterno das almas, ao
passo que o Estado tem apenas como escopo o bem temporal dos indivíduos.
Mas não foi apenas na antiguidade e na Idade Média que os
filósofos tiveram essa preocupação ética e social. Longe de pretender fazer uma
análise sistemática das mais diferentes visões filosóficas sobre o assunto
vamos apenas ressaltar as duas correntes que já mencionamos no início do texto.
A primeira sobre a qual já falamos, corresponde às ideias de filósofos como
Sócrates e Santo Agostinho que acreditam que o ser humano é dotado de um senso
moral inato, ou seja, da capacidade natural para avaliar como as coisas e como
elas deveriam ser e, desta forma, a questão de como devemos nos comportar e
agir em sociedade passa por uma questão de foro íntimo e espiritual,
introspectivo, que pode ser resumida na frase: “conhece-te a ti mesmo”. Mas
essa visão não é a única e filósofos há que acreditam que que as diversas
tendências culturais são determinantes da formação do caráter e da
personalidade e por isso dão uma ênfase maior em como os aspectos sociais e
culturais são determinantes das relações humanas.
Um exemplo desta perspectiva nós encontramos no século XIX,
com o filósofo alemão Friedrich Hegel, que aprofundou de maneira ímpar a
perspectiva Homem – Cultura e História, sendo que a ética deve ser determinada
pelas relações sociais. Como sujeitos históricos culturais, nossas ações devem
ser determinadas pela harmonia entre vontade subjetiva individual e a vontade
objetiva cultural. O homem é visto como sujeito histórico-social, e como tal
sua ação não pode mais ser analisada fora da coletividade, por isso a ética
ganha um dimensionamento político: uma ação eticamente boa é politicamente boa,
e contribui para o aumento da justiça e distribuição igualitária do poder entre
os homens. O ideal ético para Hegel estava numa vida livre dentro de um Estado
livre, um Estado de direito, que preservasse os direitos dos homens e lhes
cobrasse seus deveres, onde a consciência moral e as leis do direito não
estivessem nem separadas e nem em contradição. E os grandes problemas éticos se
encontram em três momentos da eticidade que são a família, a sociedade civil e
o Estado, e uma ética concreta não pode ignorá-los (VALLS, 1994).
Em relação à sociedade civil os problemas atuais continuam
os mais urgentes: referem-se ao trabalho e à propriedade. Não é um problema
ético a falta de trabalho, o desemprego, as formas escravizadoras do trabalho,
quando a maioria não recebe as condições mínimas nem de salário nem de infra
estrutura para sobreviver? Em relação ao Estado, os problemas, éticos são muito
ricos e complexos. A liberdade do indivíduo só se completa como liberdade do
cidadão de um Estado livre e de direito. As leis, a Constituição, as
declarações de direitos, a definição dos poderes, a divisão destes poderes para
evitar abusos, e a própria prática das eleições periódicas aparecem hoje como
questões éticas fundamentais.
Uma outra perspectiva de uma moral social encontramos
no sociólogo Émile Durkheim. A comparação que Durkheim faz da sociedade com um
organismo biológico traz ricas analogias. A sociedade é um imenso corpo social,
como um “organismo biológico” (o conjunto das instituições sociais formam este
corpo), possuindo vários órgãos (entre eles: a família, o Estado, a escola, a
Igreja), cada qual com suas funções específicas de modo que a “anatomia social”
será saudável se todos os órgãos funcionarem bem. Durkheim leva essa analogia
ainda mais além quando afirma que a partir do momento em que um desses órgãos
deixa de funcionar convenientemente, todo corpo social se ressente e adoece. E
o que torna saudável uma sociedade, fazendo com que ela funcione
harmoniosamente, é a existência de uma moral social. Cabe aos indivíduos
desenvolver planos de ação que possam influir na transformação dos aspectos
deficientes da sociedade a partir de valores que possam orientar, efetivamente,
a conduta social dos indivíduos. Vale destacar aqui, a importância que a ideia
de solidariedade representa no pensamento do sociólogo francês. A
solidariedade, dentro do contexto das regras morais e sociais, pode e deve
contribuir para a harmonia da sociedade.
Enfim, qual a contribuição que a Filosofia e, por sua vez, a
Ética, podem oferecer para nós, homens e mulheres do século XXI? No momento
histórico em que vivemos existe um problema ético-político grave. O Brasil
sempre quis ser visto o país dos justos, da democracia, da ética acima de tudo,
porém não é bem essa a realidade vivida por todos. Verifica-se uma realidade
conflitante fundamentada em uma crise de sentido e de valores que se apresenta
na vida pessoal e nas relações sociais das pessoas. A partir desse contexto
percebe-se uma inquietação acerca do sentido da vida e do papel do “ser no
mundo”, vindo assim a reaparecer com mais força o interesse pelo tema da ética,
enquanto coluna vertebral da reflexão sobre a conduta do ser humano e seus
valores. Não é suficiente para o homem comum e contemporâneo superar a crise da
ética atual conhecendo o outro e suas necessidades para se chegar a sua
convivência harmônica. Não há como superar esta crise sem um modelo de ética
voltada para uma comunidade, como na polis grega. Hoje se aposta no
individualismo, na competição, na sociedade do espetáculo e do consumo.
Acerca das reflexões sobre o ponto de vista dos filósofos,
fica claro o entendimento sobre a ética, sendo um elemento imprescindível na
sociedade. Somos formados por princípios e valores que estão relacionados a
nossa cultura e esses fatores são essenciais, para a formação do nosso caráter
no que diz respeito a nossa conduta ética e moral de modo que,
irremediavelmente, o que se entende por Filosofia e Ética está relacionado ao
conhecimento e comportamento do indivíduo na sociedade.
Referências Bibliográficas
COTRIM, Gilberto. Fundamentos de Filosofia.
15ª Ed. São Paulo: Saraiva 2004.
MONDIN, B. Introdução à Filosofia:
problemas, sistemas, autores, obras. Tradução de J. Renard. São Paulo: Paulus,
1980.
VALLS, Álvaro L. M. O que é ética. São
Paulo: Editora Brasiliense, 1994. (Coleção Primeiros Passos, 177)
http://www.portalconscienciapolitica.com.br/products/filosofia-etica-e-sociedade/
Platão (428-348 a.C.) foi discípulo de Sócrates e
escreveu trinta diálogos considerados autênticos. Hoje conhecemos a figura de
Sócrates graças aos seus diálogos, que faziam dele seu personagem principal.
Platão fundou a primeira escola conhecida no mundo ocidental na cidade de
Atenas em 387 a.C, chamada Academia, em homenagem ao herói Grego Academus, que
lutou na guerra de Tróia. Seu verdadeiro nome era Aristocles, mas foi apelidado
de Platão devido aos seus ombros largos. Era um homem rico e fazia
parte da aristocracia que governava a Grécia. Seu pai, Aristão, tinha o
rei Codros como seu antepassado e sua mãe, Perictione, foi parente de Sólon.
O pensamento de Platão foi muito
influenciado pelas filosofias de Heráclito e Parmênides. Ele
procurou reconciliar ambas as posições. Foi da controvérsia dessas duas
filosofias que surgiu a “teoria das idéias”, núcleo central de sua filosofia. O
problema que Platão propõe a resolver é o conflito “irreconciliável” entre a
teoria da mudança em Heráclito e Parmênides. Para Heráclito no universo
não há nada acabado, fixo e estável, tudo está em permanente mudança. Sua
metafísica identifica o Ser com o Não-Ser. Se o mundo é devir, vir-a-ser,
não existe um Ser fixo, estável, ele está sempre se transformando,
é sempre impermanente. Já para Parmênides as coisas que existem tem
múltiplas características, são pequenas, grandes, coloridas, pesadas, leves,
são diferentes, como homem, animal, água, fogo, etc. Se usarmos a intuição e o
raciocínio, perceberemos que há uma propriedade fixa em todas as coisas: elas
“são”. Para Parmênides, o ser é uma propriedade de todas as coisas. Tudo que
existe tem “Ser”. O Ser é fixo, eterno, imutável, infinito. Dessa forma,
as mudanças e transformações que ocorrem na natureza são uma ilusão de nossa
percepção, pois algo que é não pode deixar de ser, e algo que não é não pode
vir-a-ser, portanto, não há mudança.
Para reconciliar ambas as teorias, Platão mostrou-nos que todos nós estamos
sempre em contato com duas realidades: uma inteligível e outra sensível. A
primeira é permanente, universal, nunca se modifica, é o mundo das idéias. A
segunda é o mundo que percebemos por nossos sentidos, mutável e contingente, o
mundo sensível. Platão demonstra que o mundo tem uma forma apriori, uma
estrutura inteligível. “Através dos diálogos, Platão vai caracterizando
essas causas inteligíveis dos objetos físicos que ele chama de idéias ou
formas. Elas seriam incorpóreas e invisíveis – o que significa dizer justamente
que não está na matéria a razão de sua inteligibilidade. Seriam reais, eternas
e sempre idênticas a si mesmo, escapando a corrosão do tempo, que torna
perecíveis os objetos físicos. Merecem por isso mesmo, o qualificativo de
‘divinas’ (…). Perfeitas e imutáveis, as idéias constituiriam os modelos ou
paradigmas dos quais as coisas materiais seriam apenas cópias imperfeitas e
transitórias. Seriam, pois, tipos ideais, a transcender o plano mutável dos
objetos físicos.” (Pessanha, 1987, XVI-II).
A
teoria das idéias de Platão está diretamente ligada a sua teoria da
alma. Na parte IV do seu livro “República” Platão concebe o
homem como corpo e alma. Enquanto o corpo modifica-se e envelhece, a alma é
imutável, eterna e divina. A alma inteligente preso ao corpo um dia foi livre e
contemplou o mundo das idéias, mas as esqueceu. É somente através da busca do
conhecimento, através de um processo de recordação, de reminiscência o homem
pode lembrar-se das idéias que um dia contemplou. A realidade sem
forma, sem cor, impalpável só pode ser contemplada pela inteligência, que é o
guia da alma.
Platão divide a alma em três partes. O lado
racional está localizado na cabeça, seu objetivo é controlar os dois outros
lados, com ele adquirimos a sabedoria e a prudência. O lado irascível está
localizado no coração, seu objetivo é fazer prevalecer os sentimentos e a
impetuosidade, com ele adquirimos a coragem. Por último, temos o lado
concupiscente que está localizado no baixo-ventre, seu objetivo é satisfazer os
desejos e apetites sexuais, com ele adquirimos a moderação ou a temperança.
No Mito do Cocheiro, no diálogo “Fedro”, Platão compara a alma a uma
carruagem puxada por dois cavalos, um branco (irascível) e um negro
(concupiscível). O corpo humano é a carruagem, e o cocheiro (Razão) conduz
através das rédeas (pensamentos) os cavalos (sentimentos). Cabe ao homem
através de seus pensamentos saber conduzir seus sentimentos, pois somente assim
ele poderá se guiar no caminho do bem e da verdade.
Platão afirma que não podemos ser felizes quando somos dominados pela
concupiscência e pela cólera, isso porque as paixões sempre nos conduzem por
caminhos perigosos e contraditórios e fazem com que os desejos e impulsos
violentos de nosso corpo tirem nosso bom senso. Já dizia Sócrates que
todo vicio é ignorância. Não há nada mais deprimente do que uma pessoa que age
por impulsos e é dominada pelas paixões. Ter autocontrole é essencial para
sermos felizes. A felicidade só pode ser alcançada se formos capazes de dominar
nossos sentimentos pela razão. A moderação é uma virtude e ela se realiza
quando somos capazes de controlar a nossa concupiscência. O indivíduo moderado
é aquele que não cede as suas paixões, impulsos e prazeres. Da mesma forma o
indivíduo não se lançara a luta e a agressão indiscriminadamente, uma vez que a
razão deve saber discernir o que é bom e mal para nossa vida, sabendo dominar a
nossa alma irascível. Dessa forma, seremos felizes se através da razão
soubermos controlar nossa vida, pois a virtude natural da razão é o
conhecimento.
SEMANA 2:
A Virtude Ética
Este trabalho aborda a ética aristotélica e foi elaborado tendo como base
a obra “Ética a Nicômaco”. Nele procura-se analisar o aspecto da felicidade e
do bem, os quais marcam a busca dos seres humanos na sua caminhada de
realização, segundo o estagirita Aristóteles. O trabalho aborda também
conceitos como o bem, a educação para a virtude, o equilíbrio, na tentativa de
analisar o lugar da ética na vida social.
A escolha do tema se justifica pela necessidade de se compreender o valor
da moral nas relações humanas e também, a possibilidade de se viver uma vida
feliz, contribuindo para a criação de um mundo melhor. Segundo afirma Frateschi
, os atos são ditos justos e temperantes quando são tais quais o que faria o
justo ou o temperante: é justo e temperante não quem os realiza, mas quem os
realiza tal como os justos e temperantes os realizam.
Para tanto, é necessário retornar ao início da ética e debater os
principais conceitos desenvolvidos por Aristóteles. O trabalho enfoca
resumidamente alguns pontos importantes da “Ética a Nicômaco”, como elementos
do entendimento e estruturação do texto. Esboça também uma conclusão para o
estabelecimento das principais etapas que contribuem para um desenvolvimento equilibrado
do homem moderno.
Ética a Nicômaco foi a obra escolhida para ser analisada porque, além de
tratar os assuntos éticos e morais, nos retrata ainda, nos dez livros que a
compõem, o filósofo Aristóteles assumindo um papel de pedagogo. Um pai
preocupado com a educação de seu filho e, acima de tudo, com a sua felicidade.
Como filósofo, o mesmo aborda que o aspecto da razão deve sempre
prevalecer sobre todas as paixões, pois é somente no coletivo que o homem
atinge a sua realização.
Todos devem se esforçar para a obtenção do bem comum, que é a felicidade.
Assim, o tema central da filosofia ética de Aristóteles é a felicidade.
Dado que a felicidade é certa atividade da alma segundo perfeita virtude,
deve-se investigar a virtude, pois assim, presumivelmente, teremos também uma
melhor visão da felicidade. O verdadeiro estadista parece igualmente ocupar-se
sobretudo dela, pois pretende tornar os cidadãos bons e obedientes às leis
(...).
Para ele, esta é a finalidade última do ser humano, a qual justifica todo
esforço do homem na obtenção desse bem. Aristóteles aborda o tema nos cinco
primeiros capítulos do Livro I. Ele defende a felicidade como uma função
abrangente e necessária para a realização humana. A obra, inicialmente, se
constitui mais em uma defesa da teoria da felicidade do que propriamente uma
análise de preceitos morais do homem. Aristóteles aborda a moral e o caráter
como condição de se atingir a tal felicidade.
Tendo a ética aristotélica como pano de fundo, o trabalho pretenderá
então discorrer sobre a importância da ética como instrumento necessário para
que se atinja um modo de vida que conduza à felicidade.
Os objetivos específicos, que contribuirão para atingir o objetivo geral
do trabalho são: reflexão acerca dos valores morais da vida em sociedade,
segundo Aristóteles; problematização da importância da ética na busca do bem
comum; algumas idéias centrais que compõem a ética aristotélica e a reflexão de
alguns filósofos contemporâneos, que analisam o tema da Ética a Nicômaco. O
método utilizado para a elaboração do trabalho foi: leitura, análise, reflexão
e comentários acerca do tema.
Nessa perspectiva, este trabalho pretende analisar a ética aristotélica,
verificando sua relação com a vida particular, a vida política, desenvolvida em
sociedade, a perfeição das ações humanas e a autossuficiência, que desenvolveu
o homem moderno.
O termo “auto-suficiente” é empregado “não com referência a um homem
sozinho, vivendo uma vida de isolamento, mas também aos seus pais, filhos e
esposa e aos seus amigos e concidadãos em geral” (EN I, 7, 1097b8-11) visto que
o homem é, por natureza, um animal político. Ademais, sendo a virtude moral
produzida pelo hábito (EN II, 1, 1103a17) e sendo a prática da virtude algo que
diz respeito também às nossas ações para com os outros (V, 1, 1129b30-33), ela
deve ser estimulada e efetivada na vida (política) da cidade.
A ÉTICA ARISTOTÉLICA
A questão de saber se desejamos a vida por causa do
prazer ou o prazer por causa da vida, pode ser deixada de lado por enquanto. De
qualquer modo, a vida e o prazer parecem indissociavelmente unidos e não
admitem separação, já que não há prazer sem atividade e o prazer torna a
atividade perfeita. (Aristóteles – Ética a Nicômaco)
Segundo Lorenzetti , dentre os escritos de Aristóteles, Ética à Nicômaco,
é considerado um escrito maduro, com o seu sistema filosófico próprio e
definitivo. O contexto em que foi escrita a Ética à Nicômaco é a fundação do
Liceu em 335 a.C. a 323 a.C. A ética, nas obras Aristotélicas, é considerada
como uma parte ou um capítulo da política, que antecede a própria política. Ela
diz respeito ao indivíduo em seu relacionamento com o coletivo
A obra Ética a Nicômaco é composta por dez livros da ética e se apresenta
dividida da seguinte maneira:
• No livro primeiro trata-se do tema felicidade.
• No livro II e até ao livro IX trata-se das virtudes.
• No livro X completa o tratado da felicidade iniciado no primeiro.
Em sua obra, Aristóteles expõe sobre o bem supremo da vida humana, o qual
é a felicidade e aborda também, os mecanismos necessários para se atingir uma
vida feliz, moldada em fundamentos básicos de valores éticos. Percebe-se que a
ética preside e justifica todas as formas de se alcançar o bem supremo. Desta
maneira, para se entender o que Aristóteles considerava felicidade, faz-se
necessário compreender seu conceito sobre ela e sobre alguns princípios
necessários para alcançá-la.
ALGUNS TEMAS ABORDADOS POR ARISTÓTELES, NA OBRA ÉTICA A NICÔMACO:
FELICIDADE
São Thomaz de Aquino, em consonância com Aristóteles, define a felicidade
como operação própria do homem segundo a virtude numa vida perfeita . A busca
da felicidade justifica a ação humana. Todos os outros bens são meios para
atingir o bem maior que é a felicidade. Segundo Malinoski e Silva , em Aristóteles,
toda arte e toda indagação, assim como toda ação e todo propósito, visam a
algum bem; por isso foi dito que o bem é aquilo a que todas as coisas visam.
Ao abordar que toda ação tem uma finalidade, um fim a atingir, percebe-se
que um bem maior, ao ser atingido, justifica os bens anteriores. Aristóteles
salienta que esse bem final deve ser algo alcançável, senão não sustentaria a
ação humana em busca do mesmo. De acordo com Boto: segundo o caráter, as
pessoas são tais ou tais, mas é segundo as ações que são felizes ou o
contrário. Portanto, as personagens não agem para imitar os caracteres, mas
adquirem os caracteres graças às ações. Assim, as ações e a fábula constituem a
finalidade da tragédia, e, em tudo, a finalidade é o que mais importa.
Aristóteles apresenta vários tipos de bens a serem alcançados. Os bens
relativos e os bens intrínsecos. Os relativos são os bens necessários para a
vida cotidiana (bens materiais que trazem prazeres). São substituíveis sempre
que necessário. Os intrínsecos são os bens supremos. A felicidade é tida como
um bem supremo, todos a desejam, mas muitos a confundem com prazeres, luxúrias,
honrarias, riquezas, etc. O filósofo afirma que uma mesma pessoa pode ter uma
visão equivocada da felicidade, em épocas diferentes de sua vida. Para muitos,
a felicidade seria algo que vem suprir o que está faltando naquele momento,
como o dinheiro, a saúde, a saudade, etc. Mas é necessário entender que a
felicidade é algo maior do que as partes que a compõem.
A maioria pensa que se trata de algo simples e óbvio, como o prazer, a
riqueza ou as honrarias; mas até as pessoas componentes da maioria divergem
entre si, e muitas vezes a mesma pessoa identifica o bem com coisas diferentes,
dependendo das circunstâncias – com a saúde, quando ela está doente, e com a
riqueza quando empobrece.
A felicidade é um bem final, os demais seriam pré-requisitos para atingir
esse bem maior. Como a felicidade requer esses complementos, às vezes, a
obtenção dos mesmos é tida como se fosse a própria felicidade.
A mesma é desejada por todos e é adquirida constantemente. Não se
encontra pronta, mas em construção, feita pelo movimento das ações. É através
de suas próprias ações que o homem procura obtê-la. A felicidade é um ato
humano e essencial, conquistada somente pela prática de boas ações.
Mas evidentemente, como já dissemos, a felicidade também requer bens
exteriores, pois é impossível, ou na melhor das hipóteses não é fácil, praticar
belas ações sem os instrumentos próprios. Em muitas ações usamos amigos e riquezas
e poder político com instrumentos, e há certas coisas cuja falta empana a
felicidade – boa estirpe, bons filhos, beleza – pois o homem de má aparência,
ou mal nascido, ou só no mundo e sem filhos, tem poucas possibilidades de ser
feliz, e tê-las-á ainda menores se seus filhos e amigos forem irremediavelmente
maus ou se, tendo tido bons filhos e amigos, estes tiverem morrido. Como
dissemos, então, a felicidade parece requerer o complemento desta ventura, e é
por isto que algumas pessoas identificam a felicidade com a boa sorte, embora
outras a identificam com a Excelência .
O homem é um ser político e não consegue viver isoladamente. É vivendo
socialmente que ele tem a possibilidade de se tornar virtuoso. Ao conviver com
outros homens e compartilhando com seus pares, a obtenção do bem comum; o homem
se torna político e engajado no contexto social em que está inserido. Quem age
visando o bem comum vive feliz. Conclui-se então que, a felicidade é viver bem
e se renova constantemente na própria ação do bem viver.
As relações entre comunidade e felicidade humana. A cidade ou comunidade
política, constituindo-se em algo maior e mais complexo que os indivíduos,
tende a um fim perfeito, maior, supremo e nobre. Por essa via, indivíduo e
cidade possuem uma identidade de tendências que se resumem em configurar e
conquistar a perfeição pela ação constante e pelo raciocínio que propiciam aos
seres humanos meios de transformarem as suas potencialidades em ato. (.....)
Aristóteles postula que o que há de melhor para o ser humano é a realização do
seu fim em uma comunidade política e o relacionamento com os demais de sua
espécie. Em outros termos, as ideias de perfeição e autosuficiência estão
ligadas à ideia de felicidade por serem consideradas pelo autor estagirita a finalidade
e os objetivos para qual tendem as ações humanas que, por fim, não podem ser
realizados por indivíduos isolados e sim por intermédio da convivência amiga
entre os indivíduos.
A felicidade como um bem perfeito é desenvolvida pela razão e se manifesta
através do agir e no controle das emoções. Aristóteles considera que todas as
ações devam ser guiadas pela razão.
RAZÃO
A razão é a condição que separa o homem dos outros animais. É uma
faculdade fundamental na compreensão da felicidade. Através dela o homem pode
escolher seus comportamentos e assim praticar ações virtuosas. A virtude, para
Aristóteles seria conquistada através da razão e da ação. O homem se torna
virtuoso através do exercício constante de executar ações conscientes e
virtuosas. Somente através da prática da virtude ele alcançará a felicidade.
O que faz a marca específica do homem é o pensamento e a razão que o
segue. É a atividade intelectual. Nesta encontra-se a fonte principal das
alegrias do homem, ou seja, a fonte donde provém a verdadeira felicidade. Com
efeito, a felicidade do homem consiste no aperfeiçoamento da atividade que lhe
é própria, ou seja, na atividade segundo a razão. O homem deve, então,
subordinar o sensível ao racional. A subordinação da atividade sensível à atividade
racional se impõe. É o preço da felicidade humana e a condição da moral humana.
Portanto, para ser feliz, o homem deve viver pela inteligência e segundo a
inteligência.
A marca principal do homem é a sua atividade intelectual. Ele deve
subordinar seus pensamentos e sentimentos à razão. Para ser feliz, o homem deve
ser coordenado pela sua inteligência e racionalidade. A felicidade só é
atingida, segundo o filósofo, quando as ações estiverem em conformidade com a
razão. Segundo cita Malinoski e Silva, a atividade racional constitui a
natureza própria da felicidade.
O papel da razão é fazer com que os homens entrem em acordo sobre um bem
futuro. Embora eles não possam entrar em acordo quanto ao bem presente (porque
medem o bem e o mal pelos seus desejos), eles podem sim concordar quanto a um
bem futuro (as coisas futuras são percebidas apenas pela razão). A paz é um bem
futuro que a razão indica enquanto tal.
A racionalidade é desenvolvida através do treino, no uso adequado de suas
possibilidades. Nesse contexto, a educação exerce um papel primordial.
EDUCAÇÃO
A educação se constitui em um treino no uso da racionalidade. Esse treino
deve começar cedo, quando se está inclinado a formar bons cidadãos. Assim,
baseando-se na idéia de que vida está fundamentada em escolhas adequadas e no
aprimoramento de ações boas, exige-se do indivíduo um constante exercício,
dirigindo suas ações a determinados fins, com o objetivo de atingir a
perfeição. Através da educação e do treino, vai-se moldando o caráter, segundo
as próprias potencialidades e virtudes na prática do bem. Afirma Boto, que a
educação seria então: um rol de costumes a ser repetidamente exercitado
para com as gerações mais jovens, com o fito de que estas venham a adquirir a
força moral extraída de três estratégias educativas essenciais: “exortação,
exemplo e envolvimento. Sob tal tripé estaria colocada a missão do educador
quanto à formação dos valores: trata-se de crenças, de formação de hábitos, de
constância, de perseverança, de uso repetido, de exercício refletido, de
exemplos a serem seguidos, de ações ponderadas nas trilhas de um percurso
sempre e inevitavelmente incerto...
A ação se transforma em hábito, juntamente com o uso da razão consciente,
que proporcionará a melhor escolha, permitindo atingir o fim desejado. A
felicidade surgirá como uma premiação pelos esforços dispensados nessa meta
social. É pelo hábito das ações boas que a virtude vai-se instalando. A virtude
não é um dom. Ela é adquirida mediante ensino e treino. O homem precisa ser
educado na prática do: equilíbrio, ponderação, justiça, entre outras. O ser
humano ao agir sempre da melhor maneira, se exercitará no treino da virtude e
poderá atingir a meta felicidade. O homem inicia fazendo o bem diariamente e
este bem se torna um treino. Esse treino, com o passar dos tempos, se torna um
hábito. Esse hábito será a virtude instalada no seu repertório comportamental.
Desta forma, a virtude se manifestará em todas as ações do homem bom e feliz.
Importa reter aqui que o desejo humano pode ser aperfeiçoado pela razão,
o que garante, em princípio, a possibilidade da racionalidade de todas as
nossas ações, o que depende, por sua vez, da educação para a virtude por meio
da prática habitual de ações virtuosas. Para que seja frutífera, tal educação
deve incidir sobre os prazeres e as dores, já que estes têm efeito determinante
sobre as ações: “por causa do prazer cometemos atos vis, por cauda da dor nos
abstemos de ações belas”. Aristóteles defende que a educação certa deve começar
na infância.
A educação deve formar os cidadãos para a virtude, isto é, formar
cidadãos bons por meio dos hábitos, através do comportamento baseado em
atitudes virtuosas.
Essa educação se faz necessária não apenas porque há uma relação de
determinação entre desejo e ação, mas também porque é marca distintiva do homem
virtuoso não apenas agir virtuosamente, mas, como vimos, sentir prazer ao
praticar ações nobres, justas, virtuosas. A proposta de Aristóteles não é
educar para que se aprenda a agir de maneira “correta”, ainda que os nossos
desejos nos empurrem para o lado oposto (tal é a moralidade cristã), mas sim
educar os desejos para que sejam conformes à conduta virtuosa.
Afirma Boto, que Aristóteles reconhece a força da imitação como elemento
fundador da vida social e, mais especificamente, do ensino. A arte da
aprendizagem se reduz ao esquema de imitação. Esse imitar se inicia na infância
e se torna um processo que perdurará enquanto houver aprendizagem.
A arte de aprender se reduz, portanto, a imitar por muito tempo e a
copiar por muito tempo, como qualquer músico sabe, e qualquer pintor. E a
escrita apresenta esta importante verdade àqueles que sabem ver, porque a
escrita das pessoas mal instruídas são semelhantes, e as diferenças, quando
existem, são efeito de extravagância ou de acidente. Por outro lado, a escrita
do homem culto lhe é própria, apesar de ser mais submetida ao modelo comum.
A educação é uma possibilidade de se desenvolver a virtude, através da
experiência, do tempo e do amadurecimento do homem.
VIRTUDE
A virtude se constitui no hábito das boas ações. O homem virtuoso é
aquele que através do uso da racionalidade, faz sempre as melhores escolhas,
podendo muitas vezes sacrificar desejos pessoais em prol do coletivo.
A razão é a condição para que o homem faça as melhores escolhas e assim
se tornar o mestre e senhor de seus desejos e jamais, escravo deles. O
autocontrole é uma virtude que possibilita a ação correta. Esse processo
racional modela o caráter e a personalidade do homem. Por tanto, a virtude é
uma qualidade que só se realiza quando se age com justiça.
A virtude é, pois, uma disposição de caráter que determina a escolha de
ações e emoções e que consiste, essencialmente, na observância do meio termo
relativamente a nós, o qual é, por sua vez, determinado pelo princípio
racional. Não que seja fácil alcançá-la, pois tendemos por natureza mais às
ações e às paixões contrárias ao meio termo, de onde se segue que somos mais
facilmente levados à intemperança do que à virtude. Mas embora não seja empresa
fácil, também não é impossível encontrar o meio termo e, ao menos em princípio,
todos os seres racionais são capazes de fazê-lo e devem ser educados para
tanto.
A virtude é como a arte, todo o excesso ou falta, são elementos
destrutivos. Cabe ao homem, utilizando de sua razão, saber dosar suas ações em
busca do melhor. A virtude é exata e possui como mediação o meio-termo, ou, o
justo-meio.
JUSTO-MEIO
O excesso ou a carência é uma forma de erro que destrói a virtude.
Segundo Lorenzetti , tanto a deficiência como o excesso de exercício destroem a
força; e da mesma forma, o alimento e a bebida que ultrapassam determinados
limites, tanto para mais como para menos, destroem a saúde. Afirma também Boto
, sobre a mediatez eqüidistante entre dois extremos, que “tudo se passa no
entre”...
Aristóteles afirma que existem dois tipos de virtudes: a virtude
intelectual e a moral. A intelectual é conquistada através do ensino e
aprendizagem e é reforçada pelo tempo. A virtude moral é adquirida pelo hábito
e pelo exercício. É através da prática que nos tornamos virtuoso ou não. Nesse
quesito as relações humanas são determinantes possibilidades de manifestarmos
nossas virtudes ou não. O homem deve estar atento aos seus atos, pois é através
deles que o mesmo se construirá como virtuoso.
Segundo Santillana, quando se adquire uma virtude, age-se de acordo com
ela sem esforço e com prazer, porque se age de acordo com a própria natureza.
A virtude não é, diversamente da felicidade, uma atividade, senão que um
hábito, ou maneira habitual de ser; como tal, não pode ser adquirida da noite
para o dia, porque depende de muito exercício - repetindo certos atos o homem
acaba por transformá-los numa segunda natureza, isto é, numa disposição (e não
atividade) para no futuro agir sempre da mesma forma.
Afirma Boto que, pensar o justo meio em educação seria prescrever a ação
sensata, aquilo que, nos termos de Aristóteles, “não é demais nem muito pouco”.
O justo-meio é uma virtude, uma espécie de mediana que equilibrará a
situação. O homem deve optar por um caminho que condene ambos os extremos
sendo, pois, os causadores dos excessos e dos vícios. Comenta Dias que o
meio-termo é aquele ponto que se encontra em igual distância entre dois pontos
extremos, mas quando se trata do homem, o meio-termo é aquilo que não peca nem
por excesso e nem por defeito, e esta medida muda muito e não é única para
todos os homens.
O homem que age segundo o justo-meio, se tornará um homem virtuoso, pois
caminhará entre os vícios, escolhendo a virtude e atingindo um estado de felicidade
pessoal. A felicidade só será alcançada com o amplo desenvolvimento dessa
capacidade de caminhar no justo-termo, sem se perder nos excessos ou nas
ausências de virtudes.
Segundo Lorenzetti, é pela prática dos atos justos que se gera o homem
justo, é pela prática de atos temperantes que se gera o homem temperante; é
através da ação que existe a possibilidade de alguém tornar-se bom. Para tanto,
ele deve ser então educado no hábito das virtudes morais e fazer dessa
aprendizagem, um referencial constante em sua vida.
VIRTUDES MORAIS
O homem não pode ser visto como um ser individual, mas como uma parte
integrada em um contexto social amplo. Todas as ações humanas envolvem conteúdo
moral e estão relacionadas a práticas específicas. As ações devem ser praticadas
não apenas por parecerem corretas, mas porque, através dessas ações, o homem
conquistará a própria felicidade. Optando pelas ações adequadas, exercitadas
num contexto ético e moral, o homem materializa o bem, alcançando assim, a
felicidade.
Toda a ação origina-se no desejo do homem. Esse desejo pode ser racional
ou concupiscente. Ao fazer suas escolhas, o homem se torna o único responsável
por suas virtudes ou por seus vícios. Desta forma, nos mostra Aristóteles, que
a ação perfeita é fruto do esforço humano. O homem só se realiza por suas
ações.
É evidente, portanto, que nenhuma das várias formas de excelência moral
se constitui em nós por natureza, pois nada do que existe por natureza pode ser
alterado pelo hábito. Por exemplo, a pedra, que por natureza se move para
baixo, não pode ser habituada a mover-se para cima, ainda que alguém tente
habituá-la jogando-a dez mil vezes para cima; tampouco o fogo pode ser
habituado a mover-se para baixo, nem qualquer outra coisa que por natureza se
comporta de certa maneira pode ser habituada a comportar-se de maneira
diferente. Portanto, nem por natureza nem contrariamente à natureza a
excelência moral é engendrada em nós, mas a natureza nos dá a capacidade de
recebê-la, e esta capacidade se aperfeiçoa com o hábito
Quem não consegue realizar-se plenamente, quer seja por deficiências
intelectuais ou de caráter, jamais será digno de reconhecimento e não
conseguirá atingir a felicidade.A felicidade é definida como atividade da alma,
dirigida pela virtude perfeita; é excelente e divina, mas não é presente dos
deuses e nem produto do acaso, porque é preciso conquistá-la com muito
exercício e muita prática da virtude. Para tanto é necessário indagar sobre a
virtude e em que condição ela é um meio-termo para a felicidade.
Pelas ações nobres, o ser humano desenvolve suas virtudes. Pelo exercício
de ações justas, passa a agir moderadamente e se torna um homem justo. Pela
ação do hábito, ele se aproxima da perfeição de suas ações e se torna virtuoso.
Somente desta maneira ele atingirá a felicidade. Sem essas ações, jamais o
homem atingiria tão nobre condição de vida. Afirma Frateschi , os atos são
ditos justos e temperantes quando são tais quais os que faria o justo ou o
temperante: é justo e temperante não quem os realiza, mas quem os realiza tal
como os justos e temperantes os realizam.
A sociedade, na busca do desenvolvimento de ações virtuosas desenvolve
códigos de ética, aonde são descritos os princípios capazes de gerar qualidades
morais e os meios necessários para a prática de ações boas e esperadas
socialmente. Esses códigos atendem as exigências de uma vida social, perfeita e
equilibrada. Visam à realização da pessoa, através do hábito e de uma vida
harmoniosa, próspera e feliz.
O conceito de ética no pensamento filosófico de Aristóteles leva a
contextualização descritiva do que é ética, na sociedade contemporânea, neste
cenário se justifica a criação de códigos éticos para a conduta social,
profissional e empresarial em prol de uma convivência mais harmônica, justa e
livre.
AMIZADE
Dentro das virtudes morais, o aspecto amizade é um elemento importante,
tanto que Aristóteles fala, no livro VIII sobre a natureza da amizade. Ele
aborda que a amizade envolve convívio, semelhança, tempo e intimidade. A
amizade envolve também a razão, visto que podemos escolher nossos amigos de
acordo com nossos critérios. Assim, supõe-se que também somos escolhidos de
acordo com critérios, como amigos ou colegas. O convívio entre amigos parece
ser um facilitar da própria vivência pessoal. Junto a amigos, as pessoas
parecem mais seguras para agir.
Mesmo quando viajamos para outras terras podemos observar a existência
generalizada de uma afinidade e afeição natural entre as pessoas. A amizade
parece também manter as cidades unidas, e parece que os legisladores se
preocupam mais com ela do que com a justiça; efetivamente, a concórdia parece
assemelhar-se à amizade, e eles procuram assegurá-la mais que tudo, ao mesmo
tempo em que repelem tanto quanto possível o facciosismo, que é a inimizade nas
cidades. Quando as pessoas são amigas não têm necessidade de justiça, enquanto
mesmo quando são justas elas necessitam da amizade; considera-se que a mais
autêntica forma de justiça é uma disposição amistosa. E a amizade não é somente
necessária; ela também é nobilitante, pois louvamos as pessoas amigas de seus
amigos, e pensamos que uma das coisas mais nobilitantes é ter muitos amigos;
além disso, há quem diga que a bondade e a amizade se encontram nas mesmas
pessoas.
POLÍTICA
Na obra aristotélica, a política se relaciona com a ética. Ela constitui
uma ética prática, ou seja, o agir em comunidade deve seguir os mesmos
preceitos éticos estabelecidos para a individual. Assim, a política exige o
desenvolvimento de boas ações, apoiadas na racionalidade, na educação e na
amizade entre as pessoas.
Ora, a política mostra ser dessa natureza, pois é ela que determina quais
as ciências que devem ser estudadas num Estado, quais são as que cada cidadão
deve aprender, e até que ponto; e vemos que até as faculdades tidas em maior
apreço, como a estratégia, a economia e a retórica, estão sujeitas a ela.
O bom administrador deve governar direcionando suas ações para a obtenção
da felicidade de todos os que compõem a comunidade. Para isso, a política deve
encontrar formas de governos e instituições que favoreçam atingir o seu
objetivo, que é viver uma vida feliz e harmoniosa. Segundo afirma Rocha , o
objetivo da vida política é o melhor dos fins, e essa ciência dedica o melhor
de seus esforços a fazer com que seus cidadãos sejam bons e capazes de nobres
ações.
Para Aristóteles, a política assume o caráter de ciência e se divide em
duas vertentes: uma é a ética que se preocupa com o individual e a outra é a
política propriamente dita, que se preocupa com o coletivo.
Vemos que toda cidade é uma espécie de comunidade, e toda comunidade se
forma com vistas a algum bem, pois todas as ações de todos os homens são
praticadas com vistas ao que lhes parece um bem; se todas as comunidades visam
a algum bem, é evidente que a mais importante de todas elas e que inclui todas
as outras tem mais que todas este objetivo e visa ao mais importante de todos
os bens; ela se chama cidade e é a comunidade política.
Para obter a felicidade, o homem deve desenvolver e exercer suas
capacidades no interior do convívio social. Quem governa, deve governar com a
intenção de permitir ao cidadão se desenvolver vivendo uma vida ampla e feliz.
Cabe ao Estado essa obrigação com o coletivo. O coletivo é superior ao
individual. Como o homem, para Aristóteles é um animal político, ele considera
que o mesmo só se constituirá junto a polis, interagindo com outros homens.
Fica evidente, portanto, que a cidade participa das coisas da natureza,
que o homem é um animal político, por natureza, que deve viver em sociedade, e
que aquele que, por instinto e não por inibição de qualquer circunstância,
deixa de participar de uma cidade, é um ser vil ou superior ao homem.
Desde antes da Grécia antiga, já se discursava sobre ética. Para
Aristóteles, ela é a conduta virtuosa para a busca do bem primordial, ou seja,
a felicidade, individual e consequentemente, de toda a sociedade. Composta por
ações humanas formada com consciência. Afirma Goldim que, Foucault dizia que a
ética grega é uma estética, ou uma poética, preocupando-se com a arte de viver,
com a elaboração de uma vida bela e boa.
É no convívio social, que transparece os valores éticos e morais, assim
como o desenvolvimento destes. No excesso ou na carência o homem não se
beneficiará, poderá ter seu caráter prejudicado, assim como ao meio aonde vive
e interage, prejudicando o social. O ser humano deve compreender de que sozinho
ele não atinge a sua perfeição. Somente no contato com o outro é que ele poderá
agir como homem virtuoso, ao praticar atos nobres. É na observação e reflexão
que irá originar-se a doutrina do justo-meio. O comedimento, a moderação, o
afastamento do excedente vem para amparar a conduta virtuosa.
De acordo com a ética aristotélica, o homem só se tornará perfeito e
virtuoso, quando dominar seu caráter e agir racionalmente. Para que isso
aconteça, ele deverá escolher agir guiado pelo meio-termo entre duas situações.
Seguindo esse critério, ele se exercitará no hábito das boas ações, as quais o
levarão ao sucesso almejado e encontrara no justo meio, a virtude, a qual se
desenvolve visando o bem estar pleno do ser humano.
A felicidade é algo que todos desejam e ela só pode ser conquistada
através de muito esforço. Utilizando-se da razão, o homem deverá fazer suas
escolhas, consciente de que ninguém nasce virtuoso, mas que a virtude só é
adquirida através do hábito das boas ações.
Segundo a ética aristotélica, a felicidade não está relacionada com os
prazeres, nem implica em honrarias, mas se estrutura em uma vida repleta de
posturas e comportamentos virtuosos. A virtude é uma qualidade positiva que faz
com que o indivíduo aja de forma a fazer o bem para si e para os outros. “Na
filosofia moderna, a palavra “virtude” passou a designar a força da alma ou do
caráter. Neste sentido, designa uma disposição moral para o bem. (...) a
coragem, a justiça, a lealdade” .
A política é um dos fatores determinantes na possibilidade de desenvolver
as qualidades morais. É a expressão maior na qual a convivência fará os
indivíduos convergirem para um determinado fim. Muitas vezes, as pessoas são
obrigadas a abrir mão de seus próprios ideais, para atingir o ideal coletivo.
O ser humano é destinado a ser feliz e perfeito. A ética aristotélica
permite a ele a contextualização desse potencial. A ética do meio-termo foi
elaborada para os contemporâneos, mas também se aplica em nossos dias. Ela
aborda o agir do homem como animal político, que tem linguagem e deve fazer
escolhas lógicas se quiser ser feliz.
O homem necessita de sabedoria e prudência para o trato com o mundo. Não
é agir de qualquer jeito, mas de forma ordenada, generosa, que promova a pessoa
e os direitos do outro e o bem coletivo. O fim do homem é, pois, o de realizar,
pelo exercício de sua liberdade, a perfeição de sua natureza, compreendendo a
necessidade de atingir uma sociedade mais justa e integra.
Procurando estabelecer uma aplicação de tal conceito, creio que não seria
um equívoco demonstrar que, em um processo de convivência, onde as partes têm
interesses diferentes, chegar à satisfação de todos, é o que podemos chamar de
virtude. Enquanto que seus opostos almejam por uma determinada situação, isso
implica em que cada um abra mão de alguns pontos de vista individual em
beneficio do coletivo. Ao sacrificar os desejos individuais pelo bem coletivo o
homem demonstra a virtude de seu caráter. Desta forma, pode-se supor que a
violência e demais infrações, que provocam danos a outras pessoas,
possivelmente não existiriam, se todos agissem segundo o “meio-justo” da ética
de Aristóteles.
A ética é importante para a estruturação do social. A sua falta pode
provocar a destruição de uma sociedade. Ao seguir sua orientação, teremos uma
verdadeira ciência voltada à conduta humana, que garante a obtenção da
felicidade através de uma vida regida por virtudes morais e éticas. A razão
deve direcionar as ações e com isso dominar os vícios criando bons hábitos. A
mediana entre as atitudes, as condutas e as decisões, é o mais importante para
estabelecer o equilíbrio e proporcionar o bem, assim como o desenvolvimento
harmonioso do ser em seu meio.
A sociedade brasileira, nas últimas décadas, vem sofrendo grandes
alterações, principalmente se considerarmos o comportamento dos cidadãos, as
crenças e os valores culturais. Ao considerar-se o exposto no Livro IV de sua
Ética a Nicômaco, percebemos que a sociedade atual, vive de extremos. A lógica
do consumismo, do individualismo, da competição, parece fazer valer uma ética
individualista resultando na própria exclusão social.
Na tentativa de se atingir o bem coletivo, há a necessidade do cumprimento
do exercício de uma virtude obrigatória, com existência de órgãos
fiscalizadores e controladores necessários, pois alguns ainda não atingiram
plenamente a situação de virtude e do bem coletivo. Quando o homem social deixa
de ser virtuoso, o coletivo é obrigado a intervir com sansões reparadoras, seja
no lar, na escola e na sociedade em geral. Conduta ética regida por códigos
normativos é relevante por estar presente nas menores atitudes e fica claro que
em todas as situações existem uma maneira certa, prudente e justa, de decidir e
conduzir uma tarefa específica.
Os estudos de Aristóteles podem auxiliar na ocorrência de uma mudança,
com maior responsabilidade social e ambiental e comprometimento com o futuro da
coletividade e do bem comum. Necessária também para o desenvolvimento e
sustentabilidade com o meio a qual estamos inseridos. Seguir a virtude pode
transformar as pessoas, seus propósitos e as relações sociais. Ao integrar e
reintegrar os princípios éticos e morais desenvolvem-se um espírito humano,
possivelmente mais crítico e consciente de seu dever cívico para conquista de
seus direitos.
Podemos concluir que a ética aristotélica se apresenta como fator
importante na transformação das percepções e do comportamento humano,
refletindo suas conseqüências. Através dela poder-se-ia educar a todos os
cidadãos para a conquista de um mundo mais harmonioso e fundamentado no
respeito aos valores culturais, morais, cívicos e humanos. Nota-se que a
sociedade é um fator de aprimoramento de nossa capacidade de fazer sempre a
melhor escolha. A teoria de Aristóteles apresentar o homem como um ser dotado
de capacidade de agir e de raciocinar sobre seus atos e escolhas. Ela nos
mostra o homem capaz de fazer opções e se tornar cada vez melhor pela prática
dos hábitos virtuosos.
A virtude está em nosso poder, do mesmo modo que o vício, pois quando
depende de nós o agir, também depende o não agir, e vice-versa, de modo que
quando temos o poder de agir quando isso é nobre, também temos o de não agir
quando é vil; e se está em nosso poder o não agir quando isso é nobre, também
está o agir quando isso é vil. Logo, depende de nós praticar atos nobres ou
vis, e se é isso que se entende por ser bom ou mau, então depende de nós sermos
virtuosos ou viciosos.
Pode-se então concluir que o homem contemporâneo, ao fazer uso de sua
capacidade racional, consegue atingir a própria felicidade. Desta forma, a
felicidade é uma questão individual a ser desenvolvida no relacionamento
social. É no racional que o homem domina a sua própria natureza. A razão deve
sempre prevalecer sobre a sensibilidade. Somente agindo guiado pelo racional e
dentro dos padrões da virtude e da moral, o homem vai se disciplinando para
conquistar a verdadeira felicidade. Ser feliz é ser capaz de viver com inteligência,
fazendo escolhas adequadas e se disciplinando. A felicidade pode se apresentar
de várias formas exteriormente, mas é somente em seu interior que o homem
consegue atingi - la plenamente. Segundo Malinoski e Silva, a atividade
racional constitui a natureza própria da felicidade.
O que faz a marca específica do homem é o pensamento e a razão que o segue. É a atividade intelectual. Nesta encontra-se a fonte principal das alegrias do homem, ou seja, a fonte donde provém a verdadeira felicidade. Com efeito, a felicidade do homem consiste no aperfeiçoamento da atividade que lhe é própria, ou seja, na atividade segundo a razão. O homem deve, então, subordinar o sensível ao racional. A subordinação da atividade sensível à atividade racional se impõe. É o preço da felicidade humana e a condição da moral humana. Portanto, para ser feliz, o homem deve viver pela inteligência e segundo a inteligência. (.......) Mas evidentemente, como já dissemos, a felicidade também requer bens exteriores, pois é impossível, ou na melhor das hipóteses não é fácil, praticar belas ações sem os instrumentos próprios. Em muitas ações usamos amigos e riquezas e poder político com instrumentos, e há certas coisas cuja falta empana a felicidade – boa estirpe, bons filhos, beleza – pois o homem de má aparência, ou mal nascido, ou só no mundo e sem filhos, tem poucas possibilidades de ser feliz, e tê-las-á ainda menores se seus filhos e amigos forem irremediavelmente maus ou se, tendo tido bons filhos e amigos, estes tiverem morrido. Como dissemos, então, a felicidade parece requerer o complemento desta ventura, e é por isto que algumas pessoas identificam a felicidade com a boa sorte, embora outras a identificam com a Excelência.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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JAPIASSÚ, H. e MARCONDES. D., Dicionário Básico de Filosofia , Rio de Janeiro:
SEMANA 3:
A virtude da razão prática
Ética aristotélica
A ética de Aristóteles estabelece como ponto de
partida que o fim último de todo ser humano é a felicidade. Segundo
Aristóteles, para chegar à felicidade, deve ser analisado a natureza humana.
Desta maneira chega-se à conclusão de que a cada ser é feliz realizando a
atividade que lhe é própria e natural. Isto é, o homem é feliz sendo homem e
levando a cabo atividades próprias dos homens.
A forma mais perfeita, e a sua vez irrealizável, de
atingir a felicidade é a atividade contemplativa. No entanto, este tipo de
felicidade é própria dos deuses. O ser humano, devido a suas necessidades, tem
de conformar com uma felicidade limitada, consistente na posse de bens corporales
e exteriores e que sem as virtudes morais não poderia ser conseguido.
Dentro do ser humano, para Aristóteles, existem
dois tipos de virtudes fundamentais. As virtudes intelectuais, dedicadas a
aperfeiçoar o conhecimento, e as virtudes morais que aperfeiçoam a forma de ser
da cada pessoa. Entre as virtudes intelectuais encontra-se a prudência, virtude
de grande importância para Aristóteles na vida prática.
Por outra parte, as virtudes morais são definidas
por Aristóteles como hábitos que nos permitem eleger entre o mais correto e
conveniente dentro de um meio-termo racionalmente estabelecido. Por isso é
importante a prudência, já que nos ajuda a estipular um meio-termo.
Além da prudência, Aristóteles outorga um local
relevante a outras virtudes como são a justiça e a amizade.
Ética a Nicómaco é a obra de Aristóteles mais
importante sobre a moral. Consta de dez livros, compostos a sua vez de dez
capítulos. Apresenta a estrutura seguinte:
Livro I: determina-se em que consiste a felicidade
e se chega à conclusão de que a felicidade perfeita se atinge mediante a
atividade intelectual. Também se faz uma distinção entre virtudes intelectuais
(dianoéticas) e morais (éticas).
Livros II-V: estudam-se as virtudes morais
(meio-termo, justiça).
Livro VI: estudam-se as virtudes intelectuais.
Livro VII: fazem-se considerações sobre a
incontinência e o prazer.
Livros VIII-IX: estuda-se a amizade e suas
diferentes formas.
Livro X: tratam-se dois temas fundamentalmente, o
prazer e a vida contemplativa como ideal de felicidade perfeita.
Idéias fundamentais do livro VI da obra:
Este livro divide-se em oito capítulos e, como
citei anteriormente, trata sobre o tema das virtudes intelectuais ou dianoéticas.
Capítulo primeiro: narra-se o passo das virtudes
morais às intelectuais. As virtudes intelectuais pertencem à parte racional da
alma, a qual se divide em parte científica e calculadora.
Capítulo segundo: distinguem-se duas idéias
fundamentais: a) as virtudes intelectuais são ordens que beneficiam o lucro da
verdade; b) a verdade própria de parte-a calculadora é a verdade conforme com o
desejo reto.
Capítulo terceiro: Aristóteles especifica cinco
virtudes intelectuais: intelecto, sabedoria, ciência, arte ou técnica e
prudência. Define ademais a ciência por ser necessária e demonstrativa.
Capítulo quarto: neste capítulo trata-se sobre a
arte ou técnica. A arte é um hábito referido à produção e dirigido por uma
razão verdadeira.
Capítulo quinto: Agora Aristóteles se centra em uma
virtude de ação, a prudência. A prudência é a ajuda ao ser humano a distinguir
entre o bom e o mau. Esta virtude junto da arte são as que se ocupam da
atividade humana, segundo Aristóteles o que pode ser de outra maneira de como
é.
Capítulo sexto: Neste capítulo explica-se o intelecto
como a capacidade de intuir os princípios dos que parte toda demonstração de
uma ciência.
Capítulo sétimo: Explica-se a sabedoria. A
sabedoria é uma das virtudes que cobrem o âmbito do conhecimento teórico e que
une a ciência à intuição dos princípios últimos. Deve ser distinguido
claramente da prudência, já que a sabedoria é um conhecimento universal de
realidades excelsas e a prudência atende ao particular e concreto dos bens
humanos.
Capítulo oitavo: Aristóteles trata novamente da
prudência explicando seu laço com a política e reiterando seu caráter
particular relacionado com a experiência.
Resumo da cada capítulo do livro VI:
Capítulo primeiro: as partes da alma racional:
virtudes intelectuais e morais
A alma rege-se por dois tipos de virtudes, as
morais e as do intelecto. A alma divide-se em racional e irracional e a alma
racional, a sua vez, divide-se em outras duas partes. Uma parte com a que somos
capazes de compreender os princípios que não podem ser de outra maneira e outra
que sim possui esta faculdade. A primeira parte denomina-se científica e a
segunda calculativa. Ademais devemos achar a virtude na melhor disposição da
cada uma.
Capítulo segundo: a eleição: raciocínio verdadeiro
e desejo reto
Na alma três princípios regem a ação que são: a
sensação, o entendimento e o desejo. A sensação não participa da ação. No
desejo, a perseguição e fugida correspondem-se com afirmação e negação no
pensamento e, como a virtude moral está condicionada à eleição, razão e desejo
devem de coincidir. Isto é, o raciocínio tem que ser verdadeiro e o desejo reto
para que a eleição seja boa. O entendimento e a verdade por sua vez pertencem à
parte prática, o que permite que verdade e desejo reto estejam de acordo.
O princípio da ação persegue o fim da eleição. Por
isso, não teria eleição sem entendimento, reflexão e disposição moral. Ademais,
o entendimento é prático e criador. Tudo se leva a cabo com um fim e, o objeto
do desejo é, precisamente, fazer bem esse fim.
Portanto, as disposições que mais beneficiem à obra
das partes intelectivas, isto é, a verdade, serão as virtudes de ambas.
Capítulo terceiro: as cinco virtudes intelectuais.
A ciência
As virtudes intelectuais somam cinco: a arte, a
ciência, a prudência, a sabedoria e o intelecto.
A ciência pode ser definido como necessária e eterna,
não pode ser de outra maneira. Toda ciência deve ser ensinada e, por tanto,
todo o que implica deve ser aprendido. Para isso podem ser utilizado diferentes
métodos como o silogismo e a indução, o que significa que a ciência é
demonstrativa.
Capítulo quarto: a técnica ou arte
Entre as coisas que podem ser de outra maneira se
distingue a ação e a produção. Portanto, também será diferente a disposição
racional para a ação da disposição para a produção. Já que, toda técnica ou
arte tem como missão criar e construir, então, se acha dentro do que é objeto
de produção e vai acompanhado da razão verdadeira.
Capítulo quinto: a prudência
A prudência encontra-se nos homens prudentes,
aqueles que buscam o melhor e mais conveniente para si mesmos. O homem prudente
é a sua vez reflexivo, mas só reflete sobre o que pode demonstrar, o que pode
ser de outra forma.
A prudência não é uma ciência, nem uma arte, nem
uma técnica, é uma disposição racional verdadeira e prática respeito do que é
bom e mau para o homem.
Aristóteles considera aos administradores e
políticos homens prudentes, por exemplo Pericles.
A prudência, ademais, é uma virtude de uma das duas
partes racionais da alma. Mas não é só uma disposição racional já que a
prudência não pode ser esquecido.
Capítulo sexto: o intelecto
A ciência é demonstrativa e parte de uns princípios
fundamentais (ciência, prudência, sabedoria, técnica ou arte ...). Estes
princípios ou formas de conhecimento mediante as que atingimos a verdade, não
podem ser objeto de demonstração, simplesmente se intuyen e a capacidade de intuir
estes princípios é o intelecto.
Capítulo sétimo: a sabedoria
A sabedoria atribui-se às pessoas mais experientes
em algumas artes ou às que possuem sabedoria de modo geral. A sabedoria
considera-se a forma mais perfeita de conhecimento, une a ciência com o intelecto.
Os sábios devem conhecer os princípios últimos e possuir a verdade sobre eles.
Deve ser tido claro que a sabedoria é uma forma de
conhecimento universal que se ocupa do que é mais excelente por natureza, não
pode ser considerado a política ou a prudência o mais excelente já que atendem
ao particular, ao prático e têm por objeto o humano, o que pode ser deliberado.
Capítulo oitavo: a prudência e a política. O
conhecimento do particular
A essência da política e da prudência não é a mesma
embora correspondam à mesma disposição. Ambas se dirigem para o particular e
buscam o bem para uma pessoa ou um grupo de pessoas. Mas quando a prudência se
aplica à cidade recebe o nome de política, no entanto, se se fala de um mesmo,
de um único indivíduo, então se utiliza o nome de prudência.
Comentário sobre o Capítulo quinto: a prudência
Este texto segue a estrutura fundamental que
Aristóteles dava a seus escritos. Primeiro diz-nos/dí-nos de que fala. Claramente
o tema principal é a prudência. A prudência é um tipo de conhecimento prático (frónesis)
e, portanto, relativo à ação do homem. Para Aristóteles existem dois tipos de
conhecimento, um teórico cujo princípio é a ciência, e outro prático que se
subdivide em arte (poiesis) e moral (praxis). A arte é um fim externo ao agente
enquanto a moral é um fim interno.
O seguinte passo que dá Aristóteles é expor o tipo
de método que vai utilizar para tratar o tema. Neste caso, utiliza o método inductivo,
isto é, vai de casos particulares a casos gerais. Além do inductivo também se
serve do método paradigmático, põe exemplos, paradigmas. Isto se justifica no
texto quando Aristóteles diz que a prudência se encontra nos homens prudentes,
nos que buscam o mais bom e conveniente para eles mesmos e para viver bem de
modo geral. Por exemplo, põe a Pericles como protótipo de homem prudente e a
todos os administradores e políticos que são como ele. A prudência poderia ser
considerado de alguma maneira como o fim último da subordinación, isto é,
mediante a prudência se pretende viver bem e, portanto, se se vive bem se
consegue a felicidade.
Aristóteles diz-nos/dí-nos que o homem prudente é
também reflexivo, no entanto isto é puramente teórico já que, ninguém reflete
sobre o necessário, o que não pode ser mudado. A prudência não é ciência, nem
arte, nem técnica, não há demonstração nem pode ser de outra maneira. Esta é a
parte do texto na que Aristóteles diferencia a prudência de outros princípios
que se lhe parecem e podem causar confusão.
Agora se chega no ponto de dar uma definição
concreta de prudência e a detalha como uma “disposição racional verdadeira e
prática respeito do que é bom e mau para o homem”.
Finalmente, Aristóteles clarifica que a prudência é
uma virtude não uma arte e pertence a uma das duas partes racionais da alma, a
que forma opiniões. Ademais, há que ter em conta que a prudência não é
unicamente uma disposição racional já que não poderia ser esquecido.
SEMANA 4:
O voluntário e o involuntário, condição
préviada harmonização entre a inclinação natural e a razão prática.
A virtude relaciona-se com paixões e
ações, mas, um sentimento ou uma ação pode ser voluntária ou involuntária. Às
paixões ou ações voluntárias dispensa-se louvor e censura, enquanto as
involuntárias merecem perdão e, às vezes, piedade; por isso, é necessário
distinguir entre o voluntário e involuntário. São involuntárias aquelas ações
que ocorrem sob compulsão e ignorância, é compulsório ou forçado aquilo em que
o princípio motor está fora de nós e para tal em nada contribui a pessoa que
age ou sente a paixão. Há atos praticados para evitar males maiores:
"Se um tirano ordenasse a alguém um ato vil e esse, tendo pais e
filhos em poder daquele, praticasse o ato para salvá-los de serem mortos...
Tais atos assemelham-se aos
voluntários pelo fato de serem escolhidos, e o princípio motor estar no agente,
por estar na pessoa fazer ou não fazer. Ações de tal espécie são voluntárias,
mas, em abstrato talvez sejam involuntárias, já que ninguém as escolheria por
si mesmas. As ações são forçadas quando as causas encontram-se externas ao
agente e ele em nada contribuiu. O voluntário parece ser aquilo cujo motor se
encontra no próprio agente que tenha conhecimento das circunstâncias
particulares do ato.
Também o ato de escolher parece ser
voluntário, mas não se identifica ao voluntário porque seu conceito é mais
extenso. Os atos praticados sob o impulso do momento podem ser voluntários, mas
não escolhidos, a escolha não é comum às criaturas irracionais pois essas agem
segundo seu apetite; a escolha envolve um princípio racional e o pensamento,
ela é aquilo que colocamos diante de outras coisas.
O objeto da escolha é algo que está
em nosso alcance e este é desejado após a deliberação. A escolha é, portanto,
um desejo deliberado. Mas como o fim é aquilo que desejamos e o meio aquilo que
deliberamos e escolhemos, as ações devem concordar com a escolha e serem
voluntárias. O exercício da virtude diz respeito aos meios, logo, a virtude
está em nosso poder de escolha. Em outras palavras, podemos escolher entre a
virtude e o vício, porque se depende de nós o agir, também depende o não agir.
Depende de nós praticarmos atos nobres ou vis, ou então, depende de nós sermos
virtuosos ou viciosos: "(…) O homem é um princípio motor e pai de suas
ações como o é de seus filhos.
Os atos que encontram-se em nós, também devem estar
em nosso poder e serem voluntários. É pelo exercício de atividades sobre
objetos particulares que se formam as disposições de caráter. Não menos
irracional é supor que um homem que age injustamente não deseja ser injusto, ou
aquele que corre atrás de todos os prazeres não deseja ser intemperante:
"Podemos
supor o caso de um homem que seja enfermo voluntariamente, por viver na
incontinência e desobedecer os seus médicos. Nesse caso, a princípio dependia
dele o não ser doente, mas agora não sucede assim, porquanto virou as costas à
sua oportunidade. Tal como para quem arremessou uma pedra, já não é possível
recuperá-la; e contudo, estava em nosso poder não arremessar, visto que o
princípio motor encontrava-se no agente...
O mesmo acontece com os vícios, que a princípio
dependiam dos homens não se tornarem viciosos, mas foi por sua própria vontade e
escolha que tornaram-se assim. Agora, já não é possível ser diferente. Fica
esclarecido que as virtudes são voluntárias, porque somos senhores de nossos
atos se conhecemos as circunstâncias, e estava em nosso poder o agir ou o não
agir de tal maneira. Os vícios também são voluntários, porque o mesmo se aplica
a eles.
(andrêia)-
é meio-termo em relação ao sentimento de medo e de confiança.
As coisas
que tememos são terríveis e as qualificamos como males. Nós tememos todos os
males, e temer certas coisas é até justo e nobre – é vil não temê-las. A
pobreza ou a doença não devemos temer, nem aquelas coisas que procedem do vício
ou aquelas que não dependem de nós; é covarde aquele que não suporta os
insultos ou a inveja como deve. A bravura relaciona-se com as coisas mais
nobres como a morte na guerra, e bravo é aquele que se mostra destemido em face
a uma morte honrosa.
Os
bravos, embora temam aquelas coisas que estão acima das forças humanas,
caracterizam-se por enfrentá-las como se deve. Mas aquele que diz não ter medo,
que é insensível ao que realmente é terrível, é o homem temerário; ele é um
simulador de coragem, porque deseja parecer corajoso. Em contrapartida, aquele
que excede no medo é covarde, porque ele teme o que não deve temer, falta-lhe
confiança e é dado ao desespero por temer certas coisas.
A
covardia e a temeridade são a carência e o excesso e a posição correta é a
bravura.
(Sofrosíne)- é o meio-termo em relação aos
prazeres e dores.
As espécies dos prazeres com que se relaciona são
os prazeres corporais. Mas não se relaciona aos objetos da visão, nem da
audição ou do olfato. A temperança e a intemperança relacionam-se aos prazeres
do tato e do paladar.
Ao intemperante somente interessa o gozo do objeto
em si, no comer e beber e na união dos sexos. Por causa dos prazeres, a
intemperança é, dentre os vícios, a mais difundida; e é motivo de censura
porque nos domina, não como homens, mas como animais.
O apetite é natural, mas o engano é o excesso. Os
intemperantes excedem com o que não devem, e mais do que devem.
O excesso em relação aos prazeres é intemperança e
é culpável, porque, nesse estado, somos levados pelo apetite. O temperante, que
ocupa a posição mediana, não aprecia o que não deve, nem nada disso em excesso.
Os apetites devem ser poucos e moderados, e não podem opor-se, de modo algum,
ao princípio racional. No homem temperante, o elemento apetitivo harmoniza-se
ao racional, o que ambos tem em mira é o nobre.
(Eleuteriótes)-
é o meio-termo no dar e no receber dinheiro. O excesso é a prodigalidade e a
deficiência é a avareza.
O homem
liberal é louvado no tocante a dar e receber riquezas, mas é especialmente
louvado aquele que sabe dar suas riquezas. O avarento quer o dinheiro mais do
que deve e o pródigo esbanja a riqueza com seus prazeres. Quem melhor usa a
riqueza é aquele que possui a virtude a ela associada: o homem liberal.
O homem
liberal dá as quantias que convém, às pessoas que convém e na ocasião que
convém, com todas as demais condições que acompanham a reta ação de dar, com
prazer e sem dor. A liberalidade é uma disposição de caráter daquele que dá.
A avareza
é deficiente no dar e excede no receber; a prodigalidade excede no dar e no não
receber, esses não tardam em exaurir suas posses porque dão em excesso.
(Megaloprépeia)- é um meio-termo quanto ao
dinheiro dado em grandes quantias; o excesso é a vulgaridade e o mau gosto, a
deficiência é a mesquinhez.
É uma virtude relacionada com a riqueza, mas se
estende apenas às ações que envolvem gastos. A magnificência é um gasto
apropriado de grandes quantias, logo, ela deve ser apropriada ao agente e às
circunstâncias.
Sendo os gastos do homem magnificente vultuosos e
apropriados, tal serão os seus resultados. Um grande dispêndio com grandes
resultados. A magnificência é um atributo dos gastos honrosos, como os que se
relacionam a ofertas, construções e sacrifício aos deuses. Por isso o homem
pobre não pode ser magnificente, porque não tem os meios de sê-lo.
A deficiência a essa disposição de caráter é a
mesquinhez; este fica aquém da medida em tudo, em tudo o que faz estuda a
maneira de gastar menos e lamenta até o pouco que tem.
O excesso é a vulgaridade, porque gasta além do que
é justo. Por exemplo, dá um jantar de amigos na escala de um banquete de
núpcias.
(Megalopskhia)-
é o meio-termo em relação à honra e à desonra. O excesso é a ‘vaidade oca’ e a
deficiência é a humildade indébita.
O Justo
Orgulho também pode ser chamado Magnanimidade ou Respeito Próprio. O homem
magnânimo é aquele cujos mérito e pretensões são igualmente elevados, por isso
essa virtude pressupõe outras, realçando-as. O homem magnânimo reclama a honra,
mas aquela honra conferida ao homem bom lhe dará apenas prazer moderado, porque
o Justo Orgulho relaciona-se com a honra em grande escala.
Ele é um
extremo com respeito à grandeza de suas pretensões, mas é meio-termo na justiça
de suas pretensões. O objetivo do homem magnânimo é a honra, e a respeito dela
que ele é como deve ser.
O que
fica aquém é o homem indevidamente humilde, que sendo digno de coisas boas,
rouba de si o que merece e não se julga digno de coisas boas. Aqueles que
ultrapassam a medida são vaidosos; todos que ignoram a si mesmos, aventuram-se
a honrosos empreendimentos sem serem dignos para tal e logo fracassam.
O homem que excede no desejo à honra é o ambicioso
(Afilotimia), o que fica aquém é desambicioso (Filotimia), o
intermediário é o Anônimo.
A honra pode ser desejada mais ou menos do que se
convém, ou da maneira e das fontes que se convém. O homem ambicioso deseja a
honra mais que convém, o desambicioso não quer se honrado e fica aquém da
medida.
A esta disposição de caráter o que se louva é um
meio-termo no tocante à honra.
(Praótes)-
é o meio-termo em relação à cólera; aquele que excede é o irascível, o que fica
aquém é o pacato.
Louva-se
o homem que se encoleriza justificadamente, tal homem tende a não deixar-se
perturbar nem guiar-se pela paixão, mas ira-se da maneira, com as coisas e no
tempo prescrito.
A
deficiência é a pacatez, e essas pessoas não se encolerizam com coisas que
deveriam excitar sua ira; também são chamados de tolos e insensíveis.
O excesso
é o homem irascível, que encoleriza-se com coisas indevidas e mais do que
convém.
(Alétheia)- é o meio-termo no tocante à
verdade, o exagero é a jactância e o que a subestima é a falsa modéstia.
(Eutrapelia)-
é o meio-termo na aprazibilidade no proporcionar divertimento. O excesso é
a chocarrice e a deficiência a rusticidade.
(Filía)- é o meio-termo na disposição de
agradar a todos de maneira devida e amável; o excesso é o obsequioso se não tiver
propósito, e lisonjeiro se visa a um interesse próprio; a deficiência é a
pessoa mal humorada.
(Aidémôón)-
é o intermediário nas paixões e relativo a elas; aquele que excede é o acanhado
e este se envergonha de tudo, enquanto aquele que mostra deficiência é o
despudorado e não se envergonha de coisa alguma.
(Némesis)- é o meio-termo entre a inveja e o
despeito, e refere-se à dor ou prazer da boa ou má fortuna dos outros. O
excesso é a inveja, e a deficiência é o despeito.
A Justiça
(Dicaiosíne)- nela faz-se necessário
distinguir as duas espécies e mostrar em que sentido cada uma delas é um
meio-termo.
A justiça é a disposição de caráter que torna as
pessoas propensas a fazer o que é justo e a desejar o que é justo. Dessa forma,
a justiça é uma virtude completa ou é muitas vezes considerada a maior das
virtudes. É uma virtude completa por ser o exercício atual da virtude completa,
isto é, aquele que a possui pode exercer sua virtude sobre si e sobre o
próximo. Por isso se diz que somente a justiça, entre todas as virtudes, é o
bem do outro, visto que é possível fazer o que é vantajoso a um outro. O melhor
dos homens é aquele que exerce sua virtude para com o outro, pois essa tarefa é
a mais difícil.
Há dois tipos de justiça, uma que se manifesta na
distribuição das honras, de dinheiro entre aqueles que tem parte na
constituição; e outra, que tem um papel corretivo nas transações entre os
indivíduos; ela se divide em transações voluntárias e involuntárias.
Há quem defenda outro tipo de justiça, que não se
enquadra nas citadas acima, que seria a reciprocidade. A reciprocidade não é
justiça, porque pagar o mal com o mal ou o bem com o bem faz parte das ações
dos cidadãos, e não caracteriza o agir justo, salvo em alguns casos.
A justiça política divide-se em natural e legal. A
natural é aquela que tem a mesma força em toda parte; a legal é a justiça
estabelecida. Alguns pensam que toda justiça é estabelecida porque há
alterações nas coisas percebidas como justas, e se fossem naturais, teriam que
ser imutáveis, como o fogo que arde em toda a parte. No entanto, ambas as
espécies de justiça são mutáveis, as coisas justas por convenção assemelham-se
a medidas, que não são iguais em toda parte.
No tocante à justiça, cabe destacar que é o caráter
voluntário ou involuntário que determina o justo. O homem somente é justo
quando age de maneira voluntária, e se age involuntariamente não é justo nem
injusto, a não ser por acidente.
A alma
humana possui duas partes: a que tem um princípio racional e a privada de
razão. A parte racional da alma se divide em científica (direcional ou prática)
e calculativa (especulativa e teórica). A calculativa é uma parte da alma que
concebe um princípio racional, ela versa sobre coisas universais e teóricas,
que não podem ser a não ser aquilo que são. O objeto da parte calculativa é a
verdade, logo, para o conhecimento especulativo o bem se identifica com o
verdadeiro e o mal com o falso.
A alma
possui três elementos: a sensação, a razão e o desejo. A sensação não controla
a ação, e isto pode ser percebido nos animais que têm sensação, mas não
produzem ação. A razão e o desejo determinam a ação, entretanto, de modo
diferente, já que a virtude moral é uma disposição para a escolha; contudo, ela
envolve o desejo por um fim e a razão descobre os meios próprios para esse fim:
"A origem da ação é a escolha, e da escolha é o desejo e o
raciocínio com um fim em vista. Eis aí por que a escolha não pode existir nem
sem razão nem sem intelecto, nem sem uma disposição moral".
O puro
pensamento nada anima, somente possui um poder animador assim dirigido para um
fim; o homem, visto como um autor de ação, é uma união do desejo com a razão. A
virtude de uma e de outra, devem constituir-se aquilo que permite chegar à
verdade.
As
disposições, pelas quais a alma possui a verdade, são cinco: a arte, o
conhecimento científico, a sabedoria prática, a sabedoria filosófica e a razão
intuitiva.
A coragem
(andrêia)- é meio-termo em relação ao
sentimento de medo e de confiança.
As coisas que tememos são terríveis e as
qualificamos como males. Nós tememos todos os males, e temer certas coisas é
até justo e nobre – é vil não temê-las. A pobreza ou a doença não devemos
temer, nem aquelas coisas que procedem do vício ou aquelas que não dependem de
nós; é covarde aquele que não suporta os insultos ou a inveja como deve. A
bravura relaciona-se com as coisas mais nobres como a morte na guerra, e bravo
é aquele que se mostra destemido em face a uma morte honrosa.
Os bravos, embora temam aquelas coisas que estão
acima das forças humanas, caracterizam-se por enfrentá-las como se deve. Mas
aquele que diz não ter medo, que é insensível ao que realmente é terrível, é o
homem temerário; ele é um simulador de coragem, porque deseja parecer corajoso.
Em contrapartida, aquele que excede no medo é covarde, porque ele teme o que
não deve temer, falta-lhe confiança e é dado ao desespero por temer certas
coisas.
A covardia e a temeridade são a carência e o
excesso e a posição correta é a bravura.
A Temperança
(Sofrosíne)-
é o meio-termo em relação aos prazeres e dores.
As
espécies dos prazeres com que se relaciona são os prazeres corporais. Mas não
se relaciona aos objetos da visão, nem da audição ou do olfato. A temperança e
a intemperança relacionam-se aos prazeres do tato e do paladar.
Ao
intemperante somente interessa o gozo do objeto em si, no comer e beber e na
união dos sexos. Por causa dos prazeres, a intemperança é, dentre os vícios, a
mais difundida; e é motivo de censura porque nos domina, não como homens, mas
como animais.
O apetite
é natural, mas o engano é o excesso. Os intemperantes excedem com o que não
devem, e mais do que devem.
O excesso
em relação aos prazeres é intemperança e é culpável, porque, nesse estado,
somos levados pelo apetite. O temperante, que ocupa a posição mediana, não
aprecia o que não deve, nem nada disso em excesso. Os apetites devem ser poucos
e moderados, e não podem opor-se, de modo algum, ao princípio racional. No
homem temperante, o elemento apetitivo harmoniza-se ao racional, o que ambos
tem em mira é o nobre.
A
Liberalidade
(Eleuteriótes)- é o meio-termo no dar e no
receber dinheiro. O excesso é a prodigalidade e a deficiência é a avareza.
O homem liberal é louvado no tocante a dar e receber
riquezas, mas é especialmente louvado aquele que sabe dar suas riquezas. O
avarento quer o dinheiro mais do que deve e o pródigo esbanja a riqueza com
seus prazeres. Quem melhor usa a riqueza é aquele que possui a virtude a ela
associada: o homem liberal.
O homem liberal dá as quantias que convém, às
pessoas que convém e na ocasião que convém, com todas as demais condições que
acompanham a reta ação de dar, com prazer e sem dor. A liberalidade é uma
disposição de caráter daquele que dá.
A avareza é deficiente no dar e excede no receber;
a prodigalidade excede no dar e no não receber, esses não tardam em exaurir
suas posses porque dão em excesso.
A Magnificência
(Megaloprépeia)-
é um meio-termo quanto ao dinheiro dado em grandes quantias; o excesso é a
vulgaridade e o mau gosto, a deficiência é a mesquinhez.
É uma
virtude relacionada com a riqueza, mas se estende apenas às ações que envolvem
gastos. A magnificência é um gasto apropriado de grandes quantias, logo, ela
deve ser apropriada ao agente e às circunstâncias.
Sendo os
gastos do homem magnificente vultuosos e apropriados, tal serão os seus
resultados. Um grande dispêndio com grandes resultados. A magnificência é um
atributo dos gastos honrosos, como os que se relacionam a ofertas, construções
e sacrifício aos deuses. Por isso o homem pobre não pode ser magnificente,
porque não tem os meios de sê-lo.
A
deficiência a essa disposição de caráter é a mesquinhez; este fica aquém da
medida em tudo, em tudo o que faz estuda a maneira de gastar menos e lamenta
até o pouco que tem.
O excesso
é a vulgaridade, porque gasta além do que é justo. Por exemplo, dá um jantar de
amigos na escala de um banquete de núpcias.
O Justo
Orgulho
(Megalopskhia)- é o meio-termo em relação à
honra e à desonra. O excesso é a ‘vaidade oca’ e a deficiência é a humildade
indébita.
O Justo Orgulho também pode ser chamado
Magnanimidade ou Respeito Próprio. O homem magnânimo é aquele cujos mérito e
pretensões são igualmente elevados, por isso essa virtude pressupõe outras,
realçando-as. O homem magnânimo reclama a honra, mas aquela honra conferida ao
homem bom lhe dará apenas prazer moderado, porque o Justo Orgulho relaciona-se
com a honra em grande escala.
Ele é um extremo com respeito à grandeza de suas
pretensões, mas é meio-termo na justiça de suas pretensões. O objetivo do homem
magnânimo é a honra, e a respeito dela que ele é como deve ser.
O que fica aquém é o homem indevidamente humilde,
que sendo digno de coisas boas, rouba de si o que merece e não se julga digno
de coisas boas. Aqueles que ultrapassam a medida são vaidosos; todos que
ignoram a si mesmos, aventuram-se a honrosos empreendimentos sem serem dignos
para tal e logo fracassam.
Anônimo
O homem
que excede no desejo à honra é o ambicioso (Afilotimia), o que fica
aquém é desambicioso (Filotimia), o intermediário é o Anônimo.
A honra
pode ser desejada mais ou menos do que se convém, ou da maneira e das fontes
que se convém. O homem ambicioso deseja a honra mais que convém, o desambicioso
não quer se honrado e fica aquém da medida.
A esta
disposição de caráter o que se louva é um meio-termo no tocante à honra.
A Calma
(Praótes)- é o meio-termo em relação à
cólera; aquele que excede é o irascível, o que fica aquém é o pacato.
Louva-se o homem que se encoleriza justificadamente,
tal homem tende a não deixar-se perturbar nem guiar-se pela paixão, mas ira-se
da maneira, com as coisas e no tempo prescrito.
A deficiência é a pacatez, e essas pessoas não se
encolerizam com coisas que deveriam excitar sua ira; também são chamados de tolos
e insensíveis.
O excesso é o homem irascível, que encoleriza-se
com coisas indevidas e mais do que convém.
A Veracidade
(Alétheia)-
é o meio-termo no tocante à verdade, o exagero é a jactância e o que a
subestima é a falsa modéstia.
A Pessoa Espirituosa
ou Espírito
(Eutrapelia)- é o meio-termo na
aprazibilidade no proporcionar divertimento. O excesso é a chocarrice e a
deficiência a rusticidade.
A Amabilidade
(Filía)-
é o meio-termo na disposição de agradar a todos de maneira devida e amável; o
excesso é o obsequioso se não tiver propósito, e lisonjeiro se visa a um
interesse próprio; a deficiência é a pessoa mal humorada.
A
Modéstia
(Aidémôón)- é o intermediário nas paixões e
relativo a elas; aquele que excede é o acanhado e este se envergonha de tudo,
enquanto aquele que mostra deficiência é o despudorado e não se envergonha de
coisa alguma.
A Justa Indignação
(Némesis)-
é o meio-termo entre a inveja e o despeito, e refere-se à dor ou prazer da boa
ou má fortuna dos outros. O excesso é a inveja, e a deficiência é o despeito.
A Justiça
(Dicaiosíne)-
nela faz-se necessário distinguir as duas espécies e mostrar em que sentido
cada uma delas é um meio-termo.
A justiça
é a disposição de caráter que torna as pessoas propensas a fazer o que é justo
e a desejar o que é justo. Dessa forma, a justiça é uma virtude completa ou é
muitas vezes considerada a maior das virtudes. É uma virtude completa por ser o
exercício atual da virtude completa, isto é, aquele que a possui pode exercer
sua virtude sobre si e sobre o próximo. Por isso se diz que somente a justiça,
entre todas as virtudes, é o bem do outro, visto que é possível fazer o que é
vantajoso a um outro. O melhor dos homens é aquele que exerce sua virtude para
com o outro, pois essa tarefa é a mais difícil.
Há dois
tipos de justiça, uma que se manifesta na distribuição das honras, de dinheiro
entre aqueles que tem parte na constituição; e outra, que tem um papel
corretivo nas transações entre os indivíduos; ela se divide em transações
voluntárias e involuntárias.
Há quem
defenda outro tipo de justiça, que não se enquadra nas citadas acima, que seria
a reciprocidade. A reciprocidade não é justiça, porque pagar o mal com o mal ou
o bem com o bem faz parte das ações dos cidadãos, e não caracteriza o agir justo,
salvo em alguns casos.
A justiça
política divide-se em natural e legal. A natural é aquela que tem a mesma força
em toda parte; a legal é a justiça estabelecida. Alguns pensam que toda justiça
é estabelecida porque há alterações nas coisas percebidas como justas, e se
fossem naturais, teriam que ser imutáveis, como o fogo que arde em toda a
parte. No entanto, ambas as espécies de justiça são mutáveis, as coisas justas
por convenção assemelham-se a medidas, que não são iguais em toda parte.
No
tocante à justiça, cabe destacar que é o caráter voluntário ou involuntário que
determina o justo. O homem somente é justo quando age de maneira voluntária, e
se age involuntariamente não é justo nem injusto, a não ser por acidente.
As
Virtudes intelectuais
A alma humana possui duas partes: a que tem um
princípio racional e a privada de razão. A parte racional da alma se divide em
científica (direcional ou prática) e calculativa (especulativa e teórica). A
calculativa é uma parte da alma que concebe um princípio racional, ela versa
sobre coisas universais e teóricas, que não podem ser a não ser aquilo que são.
O objeto da parte calculativa é a verdade, logo, para o conhecimento
especulativo o bem se identifica com o verdadeiro e o mal com o falso.
A alma possui três elementos: a sensação, a razão e
o desejo. A sensação não controla a ação, e isto pode ser percebido nos animais
que têm sensação, mas não produzem ação. A razão e o desejo determinam a ação,
entretanto, de modo diferente, já que a virtude moral é uma disposição para a
escolha; contudo, ela envolve o desejo por um fim e a razão descobre os meios
próprios para esse fim:
"A
origem da ação é a escolha, e da escolha é o desejo e o raciocínio com um fim
em vista. Eis aí por que a escolha não pode existir nem sem razão nem sem
intelecto, nem sem uma disposição moral".
O puro pensamento nada anima, somente possui um
poder animador assim dirigido para um fim; o homem, visto como um autor de
ação, é uma união do desejo com a razão. A virtude de uma e de outra, devem constituir-se
aquilo que permite chegar à verdade.
As disposições, pelas quais a alma possui a
verdade, são cinco: a arte, o conhecimento científico, a sabedoria prática, a
sabedoria filosófica e a razão intuitiva.
- ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Trad. de Leonel Vallandro e Gerd Bornheim da versão inglesa de W. D. Rosá. Col. Os pensadores. São Paulo: Editora Abril Cultural, 1973..
- CHAUÍ, Marilena de Souza. Introdução à história da filosofia:dos pré-socráticos a Aristóteles, vol. 01. São Paulo: Brasiliense, 1994.
- DURANT, Will. Os grandes pensadores. 7a ed. Trad. de Monteiro Lobato. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1967.
- FRAILE, Guilhermo. História de la filosofía. 4a Ed. Madrid: Biblioteca de autores Cristianos, 1976.
- LADRIERE, Jean. Os desafios da racionalidade. Petrópolis: Editora Vozes, 1979.
- PADOVANI, Umberto; CASTAGNOLA, Luís. História da filosofia. São Paulo: Edições Melhoramentos, 1954.
- REALLE, Giovanni; ANTISERI, Dário. História da filosofia, vol I. 2a Ed. São Paulo: Paulus, 1991.
- ________. História del pensamiento filosofico y científico. Tomo I – Antiguedad y edad media. Barcelona: Editorial Herder, 1988.
- ROSS, Sir David. Aristóteles. Biblioteca de filosofia. Buenos Aires: sudamericana, 1957.
SEMANA 5:
A Tendência não correta ao fim: o mal moral
Aristóteles
entende que a pessoa que não apreendeu os valores e a maturidade ética é
denominada como analfabeto moral. Ele define cinco perfis de pessoas viciosas.
1. Alokastos: É a busca pelo
prazer no desejo do agradável. Depois vem o arrependimento por deixar-se
arrastar pelo prazer. É o caso das crianças que são levadas pelo desejo do
agradável.
2. Malakos: Aquele que busca
fugir da dor a todo custo, evitando-a ao máximo. Quando não resiste às
tentações, o homem torna-se mole e voluptuoso.
3. Theriotes: É aquela pessoa que
foge dos padrões humanos, tornando-se monstruoso. É o oposto ao ente divino.
4. Acrasia: É a fraqueza da
vontade. Mesmo conhecendo aquilo que é o bem, comete o que mal. Isso vem em
consequência de uma paixão arrebatadora e irresistível: enquanto desejam uma
coisa, realmente querem outras. São pessoas fracas de vontade. Sabem o que é o
bem, mas são tomadas por impulsos que as faz cometer coisas erradas. É como a
cidade que tem todas as suas leis para funcionar bem, mas não usa elas.
5. Kakos: o vicioso satisfeito e
em paz consigo mesmo. É aquela pessoa que adquiriu um hábito ruim de forma
voluntária e que se tornou um hábito vicioso.
Aqui temos uma melhor distinção
entre o que é vicioso e virtuoso.
Virtude: A pessoa
virtuosa é aquela que vai tender sempre para o fim bom e, mediante a
deliberação, vai atingi-lo da melhor forma. É quando o raciocínio prático é
verdadeiro e o desejo é correto. É a marca das virtudes éticas que buscam o bem
como fim último.
Tendo claro essa compreensão de
virtude, sabe-se distinguir bem o vicioso (o malvado). Essa distinção virá pela
sabedoria prática da razão.
Vício:
Aristóteles diz que a pessoa viciosa delibera corretamente tendo em vista um
fim errado. A sua capacidade não pode ser considerada sabedoria, mas simples
astúcia. O desejo dessa pessoa é totalmente desequilibrado e irracional. A
vontade não é submetida à deliberação e fica somente na esfera dos desejos.
O desejo pode ser bom ou ruim.
Quem vai definir se o desejo é bom é a submissão do desejo às convenções
aceitas pela Pólis, pela família e pela instituição. Mas as regras sozinhas não
resolvem tudo. Aqui a razão prática vai dizer o que é virtude e o que é vício.
A pessoa agirá de acordo com o
ambiente em que foi criado, sendo moldado pelo meio. Aristóteles vê o malvado
como aquele que não teve uma boa educação e não aprendeu as normas. O kakos
acha que está fazendo o bem pelo fato de ter aprendido errado. O perverso fica
numa confusão mental que não lhe deixa distinguir o bem do mal.
O desejo do homem malvado é uma
tendência contra a natureza, fruto de uma educação desgovernada e de uma
perversão da mente. O malvado é uma pessoa sem discernimento e, se o tivesse,
funcionaria de forma errada.
Todos, bons e maus, agem tendo em
vista o que acham bom para elas. Mas somente o homem bom aspira o que
verdadeiramente bom. O vicioso não conhece o fim realmente bom. Vive numa
confusão moral.
Aristóteles vê o malvado como um
homem ordinário e comum, e não demoníaco ou monstruoso. O que lhe falta é
refletir o pensamento, o que o leva a atitudes que não consegue distinguir.
Sendo um homem comum, ele é responsável por querer tornar-se moralmente doente
ou por querer manter a saúde ética. O kakos não sabe o que é realmente
bom, mas ele é responsável pela perversão do seu estado mental.
A ignorância do vicioso é o fruto
da negligência e por essa negligência ele merece ser censurado. Mas, de outra
parte, nem tudo aquilo que é resultado da ignorância é punido, nem tudo é
perdoado. O kakos age injustamente com a firme persuasão de que está
agindo bem, sem provar arrependimento. As pessoas que não tem arrependimento
não têm cura.
O perverso age em harmonia
consigo mesmo. Nisso ele se assemelha com o virtuoso: os dois agem
voluntariamente, com prazer e em harmonia consigo mesmo. A diferença está no
resultado final de suas ações. Não é só querer desejar, mas é preciso fazê-lo
de forma humana, isto é, moral, que buscam fins bons direcionados pela razão
prática.
Fonte: Material didático
elaborado pela Professora Barbara Botter para a disciplina Ética 2 UFES - 2016.
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